2007/01/12

O doceiro (parte 2)

A chegada na casa veio com festa, pois a primeira coisa que fizemos foi ver Cassiano correndo em direção ao quadro de Iemanjá e tapando-o com uma camiseta do Sepultura, enquanto gritava:

- Desculpa Iemanjá, mas serás substituída por uma divindade de verdade. – Ou algo assim. Mal sabia ele que a deusa dos mares o observava buscaria vingança.

Enquanto isso, Norton e João Pedro abriram suas mochilas (e a de todo mundo), decidindo que, se era para manter um culto religioso, que fosse reverenciado aquele que realmente merecia: o álcool. Então colocaram em cima de um balcão todas as em torno de dez garrafas de Caninha Garoa que trouxemos de casa e, alegres e contentes, se prostraram diante delas gritando "salve a Garoa" ou outras frases de ampla religiosidade. A euforia logo contaminou a todos, que também adoraram o falso ídolo. Menos Cassiano, é claro, que como todo neoliberal, prefere adorar bandas de metal.

Após uma sessão contínua de ampla adoração, João Pedro não resistiu e se jogou numa parede, sentando no chão e rindo muito. O que deixou Norton irritado. "Não ironize nosso culto!", disse, obviamente usando termos mais sujos. João Pedro não disse nada, apenas apontou com o dedo para a porta da casa, onde se encontrava um senhor cuja aparência não foi registrada pela história, salvo seus aparentes 40 e poucos anos e a pele ressecada. Trazia nos braço incontáveis quantidades daquelas caixas cheias de doce que o pessoal da praia vende de casa em casa. E aquelas coisas são realmente deliciosas. Por esses e outros motivos, recebeu a curiosa denominação de Doceiro. E é sobre ele que se trata essa história.

A característica mais marcante do Doceiro, como já foi frisado, é que ele vendia doce. O que é justificável, pois se ele vendesse sorvete, ficaria conhecido como Sorveteiro, se vendesse pesca, seria Pesqueiro, se vendesse redes, seria a cigana e se vendesse o corpo de belas mulheres menores de idade a preços acessíveis seria certamente convidado pra um churrasco. Independente da profissão, pode-se afirmar que o Doceiro provinha de uma família tradicional cristã e respeitava com toda sua fé os valores da ética, moral e bons costumes. Isso ficou claramente observável pela cara de extremo horror que ele fez ao perceber a imoralidade da cerimônia pagã de adoração ao álcool que aquele bando de jovens inconseqüentes fazia olhando para garrafas e garrafas de cachaça.

Como o líder nato que (não) demonstraria ser na viagem (e também por ser entre nós o mais velho), Norton correu até o portão da casa e começou a conversar com o Doceiro. Descobriu que ele vendia doces (o que todo mundo, a essa altura, já tinha percebido) e, mais importante ainda, quanto eles custavam. O pessoal, para não ficar naquele binômio de cerveja e destilados, comprou um pouco de glicose, acompanhada dos doces. A espressão do Doceiro se alterou várias vezes no tempo que ele passou nos vendendo seus doces, sem nunca perder aquele quê de reserva, afinal estava se envolvendo com adoradores do álcool.

Assim sendo o Doceiro terminou suas lucrativas vendas e se dirigiu a outra casa – em uma velocidade um pouco maior do que seria recomendada para uma pessoa carregando caixas. Não sabemos se ele foi para casa comemorar as vendas, se foi para casa se recuperar da cerimônia que presenciara ou se ignorou tudo aquilo e foi vender mais doce por aí, mas apostamos na segunda hipótese. O fato é que, ao contrário do que todos os oráculos do mundo pudessem prever (e olha que Iemanjá estava contra nós), no dia seguinte o Doceiro voltou.

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Um comentário:

Anônimo disse...

huhuahsuahsuahsuh

o doceiro keria cachaça karaiiiiiiiiiiii

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